Ao sabor das marés

LUSO QUÊ? 07/01/2022

Editorial

Um excelente ano para tod@s! Nesta primeira edição de 2022 decidimos dedicar a nossa atenção aos mares e oceanos. Afinal de contas, são absolutamente fundamentais à vida no nosso planeta Terra. Para além disso, o mar e toda a sua mística foram sempre um elemento de maior relevo na História universal.  Foram tantas as civilizações e povos que nas ondas, na espuma e entre correntes, jogaram as suas cartadas principais. “All in”…. Por vezes com vitórias, noutros momentos vivenciando derrotas e revezes.

As marés, ora favoráveis ora destrutivas serviram de palco à construção da história e desenvolvimento das narrativas lusófonas. Épicas histórias de exploradores e navegantes, encontros e desencontros, aproximações, negócios e tratados, assaltos e roubos, namoros, casamentos e uniões diplomáticas, guerras e tratados de paz ou até alianças. Caravelas, barcos, pranchas de surf, veleiros, hidroaviões… Capitães, piratas, marinheiros, aventureiros, empreendedores ou simplesmente desesperados. Toda a beleza que a fauna e flora marinha encerram em si.

Podemos também pensar que cada um de nós vive de acordo com as suas próprias “marés”. Aquelas que vão embalando os estados de ânimo, os momentos altos e baixos, as alegrias e as tristezas, os triunfos e as derrotas. As quedas e ascensões que fazem de nós o que somos.

Eis então a nossa homenagem à bela força da natureza que se dá a conhecer nos seus matizes verdes e azulados com pinceladas brancas, acompanhada de coisinhas que nos podem fazer pensar e refletir de modo a entrar no novo ano com a maré favorável.

Até já e façam o favor de ser felizes!

1. Os vossos mares

Convidámos os nossos leitores, seguidores e subscritores a enviar-nos fotos relacionadas com a temática das marés. A ideia era que nos fizessem chegar imagens captadas por vós em território lusófono, atribuindo-lhes um título da vossa autoria. Recebemos imensas imagens, todas fantásticas, tendo selecionado algumas que poderão ver ao longo desta edição, em jeito de separador, entre cada artigo. Muito obrigado pelo vosso interesse em participar nesta iniciativa, dando a esta edição um toque único.

“Caraíbas para quê?” – foto de Rafael Cano tirada na Praia do Zavial (Algarve, Portugal)

2. Vozes doces da maresia

Uma incrível dupla lusófona, Marisa Monte e Cesária Évora, interpreta um lindíssimo poema do músico e compositor Dorival Caimmy – “É doce morrer no mar”. Segundo o autor, a criação desta letra surgiu durante uma tertúlia entre amigos realizada na casa do pai de Jorge Amado. O romance “Mar Morto”, do aclamado escritor brasileiro, terá servido de mote e inspiração a esta formidável canção. Reparem no belo mix lusófono que aqui vai!

É doce morrer no mar – Cesária Évora & Marisa Monte (3:42)


“O Cabo das Tormentas” – foto de Carmen Martínez tirada na Cidade do Cabo (África do Sul)

3. Marés ditas, escritas, pensadas

“O Atlântico é pequeno para nos separar, porque o sangue é mais forte que a água do mar.” – GABRIEL O PENSADOR

“Deve existir algo estranhamente sagrado no sal: está em nossas lágrimas e no mar…” – KHALIL GIBRAN

“Uma língua é o lugar donde se vê o mundo e de ser nela pensamento e sensibilidade. Da minha língua vê-se o mar. Na minha língua ouve-se o seu rumor como na de outros se ouvirá o da floresta ou o silêncio do deserto. Por isso a voz do mar foi em nós a da nossa inquietação. Assim o apelo que vinha dele foi o apelo que ia de nós.” – VERGÍLIO FERREIRA

“O mar não é um obstáculo: é um caminho.” – AMYR KLINK

“Esperto é o mar, que em vez da briga prefere abraçar o rochedo.” – MIA COUTO

“O coração do homem é muito parecido com o mar. Ele tem as suas tempestades, as suas marés e as suas profundezas. Ele tem as suas pérolas também.” – VINCENT VAN GOGH

“O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar.” – CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

“O mar, uma vez que lança o seu feitiço, aprisiona a pessoa na sua rede de maravilhas para sempre.” – JACQUES-YVES COSTEAU

“Arrisquei muita braçada; Na esperança de outro mar; Hoje sou carta marcada; Hoje sou jogo de azar.” – CHICO BUARQUE

“Deus ao mar o perigo e o abismo deu, mas nele é que espelhou o céu.” – FERNANDO PESSOA

“Vistas Junto ao Equador” – foto de Mari Cruz Díaz tirada na Ilha das Rolas (São Tomé e Príncipe)

4. Travessias do bacalhau

Terra Nova – série de 11 episódios onde se retrata o dia-a-dia das famílias das comunidades piscatórias da costa portuguesa nos anos 30 com os dramas, os imprevistos, as incertezas e dificuldades que a vida no mar representa. Trago-vos esta série portuguesa (os 13 episódios estão disponíveis através da plataforma RTP play) que retrata a vida na “faina maior”, a pesca do bacalhau. É uma ótima forma de aprender mais sobre esta arte e a importância vital que este peixe (e tudo o que a ele está associado) representou e representa para a sociedade lusitana, em vários níveis e vetores – económico, social, cultural, etc. É também uma excelente aproximação e contacto com diferentes sotaques da língua portuguesa, já que a ação decorre em diferentes zonas de Portugal. Está disponível a opção de ativação de legendas, o que poderá ser de grande utilidade para melhor compreender as falas.

Terra nova – episódio 1 (45:08)

“Morros Abençoados” – foto de Rita Veloso tirada no Arpoador (Rio de Janeiro, Brasil)

5. Versos que atravessam o Atlântico

Uma ode à nossa língua, o português, e à comunhão que todos os que a falamos podemos ter. A língua portuguesa é inequivocamente um idioma repleto de salpicos da maresia espalhada pelos diversos rios, mares e oceanos. É numa lógica de diversidade e mistura que a nossa língua se tem desenvolvido (embora nem sempre tenha sido fácil ou mesmo pacífica a relação de algumas fações que pretendem apropria-se dela). Que todos os “bairros” possam unir-se através das ondas, das correntes e marés. Fica aqui, à espera que o ouçam, o delicioso tema cantado por grandes intérpretes de diferentes gerações e latitudes.

Meu Bairro Minha Língua – Vinicius Terra, Elza Soares, Linn da Quebrada, Dino d’Santiago, Sara Correia (3:52)


“Agosto na Nazaré” – foto de Ángela Ruiz tirada na Praia da Nazaré (Portugal).

6. Navegando com Sophia

Se houve alguém cuja inspiração e foco de criação tiveram raiz nos mares e oceanos, essa pessoa, essa poeta/poetisa/escritora maior foi Sophia de Mello Breyner Andresen. Dona de uma obra extensa, variada no estilo, singular e exemplar (já falámos da sua mestria em anteriores edições), trata o mar e os oceanos por tu. Nos seus textos encontramos frequentemente referências e vocabulário relacionado com a temática do mar, exposto de uma forma que supõe um amplo e profundo conhecimento da fauna e flora marinha e também seguramente horas de observação e vivência a eles associados.

Durante gerações, e felizmente ainda na atualidade as suas obras formaram parte dos programas oficiais do ensino básico (antes denominado “primário”) em Portugal, sendo mesmo algumas integradas no famoso Plano Nacional de Leitura (PNL). Há uma que se destaca pela apreciação unânime que gera junto da pequenada, e até dos graúdos, falo da “Menina do Mar”. Merece absolutamente a pena escutar, sim é para ouvir sem ver, a narração e interpretação deste belo conto. Ficamos a conhecer as aventuras da menina e do mar, através de vozes conhecidas – Eunice Muñoz, Francisca Maria, António David e Luís Horta. Este projeto de 1961 contou com a direção de Artur Ramos.

A menina do mar (35:17)


“Trilho na Costa Vicentina” – foto de Ramón Vargas tirada em Vila do Bispo (Portugal)

7. Piet, surfista e Rei de Serrambi

Praias e ondas de mar salgado. Tínhamos de falar de surf.

Este breve vídeo em estilo documental trata a vida de um brasileiro descendente de holandeses que tem dedicado a vida ao surf. Chama-se Piet Snel. Viajou por todo o globo para surfar as melhores ondas, fazendo amizade com os “grandes” do surf mundial. No final dos ano 70 descobriu um local absolutamente perfeito para a prática do surf – Serrambi, em Pernambuco. Conseguiu manter a sua localização em segredo durante alguns anos, em parte devido às dificuldades de acesso e também por tratar-se de uma povoação que por então tinha aproximadamente 50 habitantes. Contudo, inevitavelmente, o segredo já foi revelado e muita gente foi chegando ao paraíso de Serrambi.

Hoje em dia Piet vive uma vida calma e tranquila lá, em Serrambi, onde surfa diariamente. Continua a criar pranchas de surf (ao longo da sua vida já construiu mais de 2000) para a sua marca “Concha Surfboards” e gosta de receber apaixonados pela modalidade que ama, dando-lhes conselhos e dicas sobre surf e também partilhando com eles a narrativa das fantásticas histórias que viveu dentro do mar ao longo de tantas décadas. Uma autêntica referência no seio do surf, como podemos constatar no documentário. Boas ondas, galera!

Surftopia (23:51)


“O Paraíso ao Pé de Mim” – foto de Mmar tirada em Vila Real de Santo António (Portugal)

8. Um farol com raízes

No mar, bem como na vida, necessitamos da ajuda de faróis para nos orientarem rumo ao destino que desejamos. Pela sua beleza, importância histórica no que à navegação respeita e pela sua original arquitetura, os faróis são alvo do interesse de muitas pessoas que os visitam por todo o mundo fora, os fotografam, documentam e colecionam em forma de miniatura.

Deixo, pois, aqui uma breve homenagem a um farol muito especial que me vem guiando desde a infância – o Farol do Bugio (Oeiras, Portugal). Este bonito edifício contruído num pequeno ilhote e situado num ponto em que o Tejo começa a unir-se com o Atlântico foi o eterno pano de fundo das aventuras e vivências que tive na praia em que nasci, para além de todas as demais façanhas que naquelas águas têm sucedido ao largo de 3 séculos de existência (podemos, por exemplo imaginar como terão sido as gloriosas batalhas entre frotas navais).

Neste breve vídeo vemos a beleza do rio Tejo na sua imensidão, ladeado pela “Marginal” e com a velhinha ponte 25 de Abril ao fundo, enquanto observamos a singularidade deste magnífico farol desde várias perspetivas.

Farol do Bugio (2:01)


“Rumo ao Paraíso” – foto de Angie tirada na Praia da Comporta (Portugal)

9. Vitória Coentrão

Se antes vimos as estórias de vida de quem procurava ganhar a vida através da pesca nos anos 30 (falo da série “Terra Nova” da RTP) dedicamos agora umas linhas a projetos inovadores levados a cabo por caras conhecidas e que pretendem trazer de volta o gosto pela pesca aliado à inovação, na esperança de manter o setor pesqueiro ativo e animar os mais jovens para que se lancem nessa vida do mar.

Fátima Lopes, a conhecida apresentadora, traz-nos este capítulo do canal de Youtube “empower brands channel” dedicado às Caxinas (bairro piscatório situado em Vila do Conde, Portugal), sem dúvida um dos locais lusitanos que rima sempre com pesca e mar. Entrevista vários intervenientes, todos ligados à pesca, sendo o ex-futebolista Fábio Coentrão a peça central deste episódio, no qual nos conta como pretende dinamizar o setor das pescas de forma inovadora e atualizada, bem como a felicidade que sente por poder (agora que já arrumou as chuteiras) regressar a casa e ao que para ele sempre foi objeto de fascínio e plenitude – o mar.

Mudar para melhor – Fábio Coentrão (17:32)


“Maresia” – foto de Pedro Roldán tirada em Albufeira (Portugal)

10. Nas ondas da guitarra

Fechamos esta edição com a mágica composição de Grutera. Um surfista e músico da Nazaré apaixonado pela guitarra. Melodias belas que resultam em temas instrumentais bem estruturados e que nos embalam. Para ler, estudar, pensar ou apenas escutar e deixar-se levar. A faixa que escolhemos – “Fica Entre Nós” – conta com um vídeo que retrata muito bem a vida no mar, do mar, para o mar… junto a ele.

Fica entre nós – Grutera (3:08)


Agradecimentos

Muito obrigado pela vossa colaboração e pelos “grãos de areia” lançados ao projeto:

  • João Antunes
  • Joca Marino
  • Nacho Flores
  • Pedro Sereno
  • Pilar Pino

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