Mulheres

LUSO QUÊ? 12/03/2021

Editorial

Mulheres!!!

Esta honesta e singela homenagem é quase um atrevimento, já que seriam necessárias páginas infinitas para poder realmente falar sobre todas as mulheres que merecem destaque pelo que são ou foram, fazem ou fizeram.

Não se trata de assumir posições, politizar ou querer lutar contra a discriminação histórica que as mulheres veem sofrendo ao longo dos séculos… obviamente que repudiamos esse ponto de vista sobre as mulheres e nos parece absurdo que seja ainda necessário ter de discutir e lutar por algo que deveria ser uma evidência absolutamente natural. Claro que ao escrevermos estas linhas estamos já, de alguma forma, a apoiar e contribuir para a luta e conquista da igualdade por parte de todas as mulheres.

Aquilo que nos propomos fazer é dedicar a publicação desta semana a exaltar e enaltecer mulheres que contribuíram ou contribuem positivamente através daquilo a que se dedicam para que o mundo evolua – seja através da arte, cultura, política, desporto, ciência ou qualquer outra área. Mais ou menos famosas, jovens ou experientes, vivas ou já falecidas, de vários países (lusófonos), estas 11 mulheres (8 de março = 8+3) merecem o devido reconhecimento. Optámos por apresentar de forma breve cada uma delas e deixar-vos o caminho aberto para poderem investigar mais sobre as vossas preferidas. A ordem em que aparecem é aleatória e não corresponde a qualquer valoração ou hierarquia específica.

Os (in)Raizados esta semana trazem-nos a estória de um português, portuense de gema que anda a fazer a vida na capital andaluza.

Mais uma semana cheia Discos Pedidos!. O que é que os nossos leitores andam a ouvir?

Até já!

1. A voz de um povo

É a senhora que figura na capa da edição desta semana. Uma voz conhecida em todo o mundo, embaixadora do Fado e cara de um país e de um povo. Quem não sabe pelo mundo fora quem é Amália Rodrigues? Arriscamos dizer que o seu nome é sinónimo de Portugal, quando ele soa em qualquer geografia do planeta. Quando canta para os portugueses, as suas palavras atingem proporções abismais! Canta para nós, canta-nos em conjunto e como se conhecesse cada um de nós na sua essência! Possuindo uma genialidade absolutamente ímpar transformou totalmente o panorama cultural contemporâneo do século XX através da sua forma singular de cantar, expressar e interpretar as palavras, a alma e as emoções. Nunca teve papas na língua e, sempre à sua maneira, desenvolveu uma magnífica e longa carreira repleta de êxitos e prémios. A sua contribuição específica para a evolução e visibilidade internacional dada ao Fado constitui um legado eterno. No ano passado comemorou-se o centenário do seu nascimento. Desfrutem de um dos seus concertos!

Amália ao vivo na TV italiana


2.  A pujança crua do sentido de missão

A primeira mulher a publicar, em 1990, um romance no seu país natal – Moçambique. Paulina Chiazane conta com uma extensa obra publicada onde aborda o tema da guerra e das grandes convulsões políticas que marcaram durante décadas o quotidiano moçambicano. O seu trabalho denota uma forte preocupação pela defesa das mulheres e dos seus direitos, apontando para fatalidades com por exemplo a poligamia vigente no seu país. Temas como o racismo e a discriminação são também prato da casa, tratados sem atalhos e medo ou subterfúgios. Espreitem esta eloquente entrevista de uma escritora que fala sem papas na língua e merece toda a atenção (só custa 25 minutinhos de vida). Vamos ouvir e pensar.

Entrevista no Programa Extra-classe – Paulina Chiziane


3. Punhos cerrados, mente aberta

Imaginam uma mulher negra integrando plenamente a redação de um jornal no início do século XX em Portugal… Agora somem a essa imagem o facto de esta mulher ser abertamente lésbica. Falo-vos de Virgínia Quaresma. Filha de um importante Oficial da Cavalaria do Exército Português e de uma doméstica (filha de escravos africanos), cedo soube que não aceitaria que decidissem por ela como seria a sua vida. Foi uma das primeiras mulheres a formar-se em Letras em Portugal e uma das primeiras mulheres a enveredar plenamente pela carreira jornalística. Realizou serviço diplomático em vários países europeus e residiu intercaladamente no Brasil, onde trabalhou como jornalista e travou várias lutas ativistas a favor de diferentes causas. Ativista crente e inabalável, enfrentou o Estado Novo e abraçou a causa da defesa dos direitos das mulheres, escrevendo vários artigos e dando entrevistas ao longo da sua vida. É considerada uma das principais responsáveis pela génese do feminismo português.

4. Dedo na ferida

E agora? Falar desta “gigante” em meia dúzia de linhas… Bem, a Adriana Calcanhotto é uma intérprete, cantora, produtora musical, escritora e mais coisas, brasileira (nascida em Porto Alegre). Apaixonada pelas palavras, pelo texto e poesia, e pela comunicação. As suas canções são realmente únicas e movimentam-se no universo particular por ela criado onde se fala de tudo sem complexos ou barreiras. A necessidade de apontar o que está errado ou incorreto, as injustiças e o mal, em busca de soluções é uma das suas características, embora tenha também canções de teor mais infantil e doce. A sua extensa discografia (realizada ao longo de 30 anos) cresceu recentemente com o lançamento do disco “Só canções da quarentena”. Vale absolutamente a pena escutar.

Adriana Calcanhotto – Só


5. Rodas para que vos quero

Há pessoas que têm dificuldade em ouvir “não” ou “não podes” ou “é impossível”. Estas palavras, quando ouvidas por elas, parece que se transformam imediatamente em combustível de alto rendimento. A narrativa pessoal de Elisabete Jacinto é uma vida com rodas, o que não significa que lhe tenha corrido sempre tudo sobre rodas. Foi e é uma absoluta pioneira, ao ter lutado durante toda a vida para encontrar  seu espaço num meio especialmente dominado por homens – o desporto motorizado. Começou por dar os primeiros passos nas motos, no Rally Dakar, mas foi ao volante de um camião que se notabilizou e alcançou os melhores resultados. Durante dezenas de anos traçou um difícil caminho rumo ao sucesso, com muitos altos e baixos. Nunca cruzou os braços. A vitória obtida no rally em 2019 representa, do ponto de vista desportivo, o momento mais alto da sua carreira, a juntar a tantos outros triunfos que foi acumulando ao longo da sua carreira. A sua estória e trajeto de vida são uma autêntica lição, um exemplo real, de como a perseverança, o esforço, a dedicação e motivação constantes na procura pela excelência naquilo que nos tem apaixonados sempre compensam. Uma mulher verdadeiramente inspiradora!

Vitória histórica no Africa Eco Race 2019


6. Matar não cala

Foi cobardemente assassinada no dia 14 de março de 2018 na região do Rio de Janeiro. Marielle Franco tinha 38 anos de idade. A História da humanidade está, infelizmente, repleta de mortes por assassinato que têm como protagonistas pessoas que lutaram firmemente pelas suas convicções de forma altruísta. Marielle foi uma socióloga e política filiada ao Partido Socialismo e Liberdade(PSOL), elegeu-se vereadora do Rio de Janeiro para a legislatura 2017-2020. Defendia o feminismo, os direitos humanos, e criticava a intervenção federal no Rio de Janeiro e a Polícia Militar, tendo denunciado vários casos de abuso de autoridade por parte de policiais contra moradores de comunidades carentes. Mataram-na vilmente, mas jamais abafarão a sua voz!

Breve entrevista – Mulher, raça e classe


7. Transístores no feminino

Elvira Fortunato é uma cientista, investigadora e professora catedrática portuguesa. É especialista pioneira mundial na eletrónica de papel, nomeadamente em transístores, memórias, baterias, ecrãs, antenas e células solares. É considerada a “mãe” do transístor de papel. Em 2020 foi distinguida pela Comissão Europeia com o Prémio Impacto Horizonte (consultem o artigo).

8. Queda para as vitórias

Um terramoto, uma força da natureza, “intratável” quando pisa o tatami. Telma Monteiro é a judoca portuguesa mais premiada de todos os tempos. Vem fazendo história ao longo dos anos, sendo detentora de um palmarés absolutamente inacreditável. Destaque para o facto de ter sido 5 vezes campeã da Europa e 4 vezes vice-campeã mundial.  Em 2016 obteve a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos. Não se deixem enganar pela sua cara simpática – quando pisa o tatami, parte a loiça toda!

Imparável


9. Morna escaldante

A alma da música cabo-verdiana. Foi ela que colocou os sons e a musicalidade das ilhas de Cabo Verde no mapa e boca do mundo. Dona de uma personalidade única, consensual, Cesária Évora começou a cantar bem cedo. Com apenas 7 anos Cize, como era conhecida pelos amigos  já animava a praça principal da sua cidade, Mindelo. A rainha da morna, como a apelidavam carinhosamente, gravou mais de 2 dezenas de discos e durante décadas viajou por todo o mundo dando concertos. Em 2004 ganhou o Grammy para melhor álbum de world music. A sua obra representa uma influência importantíssima para a música contemporânea. Tirem o pezinho do chão… soooltaaa!

Cesária Évora – Live d’amor (Paris 2004)


10. A luz das sombras

A poetisa do primeiro quarto do século XX que se tornou um ícone cultural de forma póstuma. Nos breves 36 anos que durou a sua tumultuosa vida, Florbela Espanca criou uma obra literária de referência não apenas em Portugal, país que a viu nascer na transição do século em Vila Viçosa. A sua escrita está carregada de erotismo e feminilidade. Especialista na escrita em forma de soneto, mas também com obra publicada em prosa. Rompeu padrões, saltou barreiras e foi quem quis ser, como quis ser. Até na morte. Saibam mais sobre a sua vida em obra, em apenas 10 minutos.

Ler + ler melhor – documentário


11. A beleza do bem

É uma das atrizes e apresentadoras mais conhecidas em Portugal com uma sólida carreira de dezenas de anos. A sua simpatia, empatia, tolerância e respeito pelo próximo são qualidades que todos lhe reconhecem. Catarina Furtado é, desde o ano 2000, Embaixadora de Boa Vontade do UNFPA (Fundo de População das Nações Unidas). Neste âmbito, realiza um trabalho de proximidade em diferentes países, nas áreas da Saúde, incluindo a sexual e reprodutiva, Igualdade de Género, Violência sobre as Mulheres, Discriminação, Envolvimento Masculino, Mutilação Genital Feminina, Maternidade Segura, Maternidade/Paternidade Adolescente, Planeamento Familiar, entre outras. Conheçam-na!

Entrevista no Só Visto


(in)Raizados

Esta secção está dedicada a contar as aventuras e desventuras, as peripécias e o  quotidiano de pessoas fantásticas que nasceram em países lusófonos e agora andam pelo mundo fora fazendo pela vida, fazendo a sua vida e espalhando a língua portuguesa pelos 4 cantos do globo.

Hoje vamos conhecer a estória de André, um portuense radicado em Sevilha.

André Marinho Rocha (36 anos) – Sevilha, Espanha

Para contar a minha estória, devo começar por mostrar-vos uma canção: Carminho – Saia Rodada, do Álbum Canto (2014) Esta música marca um princípio e um fim na minha vida. Um começo. Uma transição! Tal como a saia que roda, gira, flutua no ar e, sobretudo, teima em não parar, a minha vida também rodava uma vez mais, trazendo-me definitivamente a Sevilha, depois de um ano de namoro e de idas e voltas entre Sevilha e Lagos (Portugal). Trajeto repetido a bom ritmo, feito num vai e vem, estilo acordeão, estilo saia, estilo volante de um “traje de flamenco”, donde em cada volta que dá forma uma espécie de espiral que te aproxima ou distancia da tua amada e do teu país. Fecha-se um círculo apenas para abrir o seguinte, uma e outra vez. Saia que é saia nunca para. Não pode! A sua natureza é o movimento. É o seu fado. É símbolo de renovação. É o ontem e o amanhã. É a saudade dos giros que já deu e é a ânsia dos que estão por dar. É a vida!!

Umas semanas depois do que seria a minha “última” aterragem em Sevilha (Setembro de 2015) uma amiga da minha, ainda, namorada Sara, alertou-nos para a existência de um festival de Fado cujo cartaz era toda uma surpresa. Nesse instante decidimos ir ver a Carminho, sem saber que iríamos ouvir a música que nos marcaria para sempre e que se entoaria várias vezes no dia 10/03/2018. Dia do nosso casamento! Aniversário celebrado há apenas 2 dias, especial e quase irrepetível, já que fazemos 3 anos de casados e somos 3 elementos na família. Sim, entretanto a saia rodou uma vez mais e a família cresceu. A Clara nasceu!

A primeira vez que ouvi esta música foi, portanto, especial em vários sentidos pelas inúmeras “primeiras vezes” que representa. Primeiro concerto em Sevilha. Primeiro contacto com o lindíssimo e célebre Teatro Lope de Vega. Primeiro concerto de fado (a sério) que assisti na minha vida. E, claro está, a primeira música a entoar no dia do meu casamento, acompanhando a entrada e o desfile serpenteante dos noivos no salão donde se celebraria o copo de água (banquete).

És ou conheces algum (in)Raizado sobre quem possamos contar estórias aqui no LUSO QUÊ?? Escreve um breve texto com esse relato (máximo uma página A4, aproximadamente 450 palavras), junta uma foto do(s) protagonista(s) e envia-o por escrito para o endereço eletrónico disponível em O vosso espaço. Se és daquelas pessoas que dizem não ter jeito para escrever, contacta-nos e nós ajudamos-te a dar forma à aventura que tens para contar – as boas estórias não se podem perder!

Discos Pedidos!

Hoje dançamos e cantamos com…

Miguel Martínez (Sevilha, Espanha)

Eu gosto muito pela música e sobretudo pela letra e o refrão: “Vida da minha vida, peço a meu protetor, se for pra ser vivida diga pra onde eu vou”. E o pagode é simplesmente glorioso.

Vida da minha vida – Grupo fundo de quintal


Nuno Alves (Sintra, Portugal)

Apesar de não ser uma música que costume ouvir demasiado, esta faixa é muito refrescante, apesar do tema comentar uma face mais negra da nossa sociedade em bairros das cidades. Não tão bem falada e com o uso de linguagem corrente de bairro, toca e foca-se em duras realidades, cujas histórias muitas vezes não têm um final feliz. Destaco a falta de orçamento para a realização deste videoclipe, mas cujos protagonistas improvisaram com uma simplicidade fantástica.

Da Weasel – Tudo na mesma


Nesta secção desejamos que partilhem connosco as vossas canções favoritas. O que é bom é para se partilhar! Podem contar estórias relacionadas com elas, quando as ouviram por primeira vez, quem ou que situações vos recordam, situações em concertos, etc. Como? Muito simples. Basta enviar-nos um e-mail para info@lusoque.es com o vosso nome e o local de onde nos escrevem, o título da canção e o seu autor/grupo/projeto e trataremos de a publicar junto ao respetivo vídeo.

Agradecimentos

Muito obrigado pela vossa colaboração e pelos “grãos de areia” lançados ao projeto:

  • João Antunes
  • Joca Marino
  • Nacho Flores
  • Pedro Sereno
  • Pilar Pino

O vosso espaço Queres falar connosco? Tens sugestões ou ideias? Há temas ou assuntos que gostarias de ver tratados? Queres colaborar com o LUSO QUÊ?? Estamos à tua espera de braços, ouvidos e olhos bem abertos! Escreve-nos