Ultrapassagem

LUSO QUÊ? 04/12/2020

Ultrapassagem

Editorial

Esta semana regressamos com sugestões que nos farão viajar por geografias variadas, contactando com a ruralidade, o campo e a natureza no seu estado mais puro. Mas também pisaremos espaços urbanos e as ruas de grandes cidades e metrópoles, sempre focando a gente que cria, recria e conta as estórias de que o mundo é feito.

A nossa travessia inicia-se por uma imersão no cerne da música popular portuguesa, sem complexos, sem luxos nem grandes efeitos especiais ou fogos-de-artifício. Abriremos a caixinha de A Música Portuguesa a Gostar dela Própria para constatar que nem sempre é mau ser-se um pouco narcisista e que não é preciso ser-se Mozart ou Jimi Hendrix para compor temas musicais inebriantes, cantar e tocar instrumentos.

Ainda cantarolando canções ao ritmo do estalido dos dedos e entre assobios, chegamos à segunda paragem. Aterramos bem pertinho da linha equatorial, no belíssimo e açucarado arquipélago de São Tomé e Príncipe. Entre aromas de café e cacau visitaremos alguns dos locais mais emblemáticos, enquanto cozinhamos entre sorrisos Na Roça com os Tachos.

A imensa natureza exótica, este povo tão amável, generoso e genuinamente anfitrião, mais as paisagens de cortar a respiração… É uma jornada fantástica, mas lenta e progressivamente começamos agora a sentir vontade de saltar de novo até à urbe, com a sua confusão inebriante, as luzes intermitentes e o ritmo acelerado – reféns talvez desta coisa de querermos sempre o que não está à mão de semear… Então, num pulo, entramos a abrir no mundo artístico colorido, multifacetado, inovador e incrivelmente rico de Odeith e Bordalo II, dois jovens artistas portugueses absolutamente geniais na forma como conceptualizam e executam as suas obras.

Eis então que surge o convite para nos adentrarmos nos túneis da língua portuguesa, sem nos deixarmos perder nos seus labirintos. É melhor irmos com quem sabe do assunto! Vamos apanhar boleia do Babelite com os provérbios ao volante e as expressões idiomáticas no banco do pendura. E nós? Lá atrás, bem sentadinhos a gozar as curvas.

O circuito aproxima-se já do final… Vamos até ao Brasil sem sairmos do sofá, claro. Com o Novo Cine podemos empanturrar-nos de curtas até nos sair cinema de alta qualidade pelos ouvidos. Sim, em versão original! Sim, grátis! Ainda bem que há coisas das quais podemos abusar sem nos sentirmos culpados e cujos efeitos secundários só poderão ser benéficos.

Até já!

1. Música portuguesa??? Com muito gosto!

Acontece com frequência que começamos por ver o que está lá longe, no horizonte, sem antes observarmos atentamente o chão que pisamos. Não que haja algum mal nisso, cada um deve caminhar como e para onde quer. Só que andar sempre com binóculos faznos passar ao lado de verdadeiros tesouros que estão mesmo à frente do nosso nariz.

Observo como a rapidez estonteante com que recebemos música de todo o globo, de diferentes géneros e estilos, privilegiando os tops, por vezes não deixa espaço para podermos ver (neste caso escutar) os temas, as canções populares que piam em voz baixinha nos youtubes e afins.

Neste sentido, A Música Portuguesa a Gostar dela Própria, trabalho que Tiago Pereira (realizador, documentarista, visualista, mentor e coordenador deste projeto) e a sua equipa vêm realizando desde 2011 é absolutamente notório. Num excelente labor de documentação resultante de uma pesquisa exaustiva é-nos apresentado um panorama abrangente da música popular feita em Portugal , na sua versão mais autêntica e genuína. Recordam-se a tradição oral, as cantigas, os romances, os contos, as práticas sacroprofanas, as músicas, as danças e também a gastronomia, reutilizando fragmentos da memória de um povo. Aqui não encontramos estrelas e palcos gigantes, nem lantejoulas ou luzes e focos potentes, tão pouco colunas do tamanho dum camião… Em compensação somos enfeitiçados por vozes absolutamente únicas e preciosas, instrumentos artesanais e ancestrais e também instrumentos acústicos ou elétricos. Tudo isto emoldurado com os rostos do povo (desde anciãos a crianças) em cenários quotidianos (interiores e exteriores, urbanos, rurais e campestres) capazes de cortar a respiração, que contam estórias sem a necessidade de dizer.

A visita à web possibilita pesquisar por distritos e ilhas, num total de 2980 projetos apresentados em 5368 vídeos, reunindo 9171 instrumentos (dados do dia 30 de novembro de 2020). Números que à medida que teclo me parecem surreais e custam a assimilar, sublinhando a grandiosidade desta iniciativa. Podemos também aceder ao canal do youtube e escolher os vídeos a la carte.

Merece totalmente a pena dar uma vista de olhos e uma escuta de ouvidos. Pezinho de dança garantido!

2. Façam o favor de ser felizes!

É com esta melosa e alegre frase que João Carlos Silva (JCS), no seu sorriso de orelha a orelha, se despede em cada um dos episódios de “Na Roça com os Tachos”.

Neste programa da RTP2 que se emitiu entre 2003 e 2005, somos convidados a viajar pela mão de JCS através da beleza única e da tremenda paisagem exótica do arquipélago de São Tomé e Príncipe, a pretexto de aprender mais sobre a culinária local usando os recursos naturais.

Em cada capítulo JCS desloca-se a uma roça diferente onde prepara 3 pratos (normalmente uma entrada, um prato principal e uma sobremesa) usando os produtos locais. Pelo meio contacta com as gentes, faz referências culturais e históricas e mostranos aspetos da fantástica flora.

Se esperam cozinhas ultra-sónicas ou de última geração, tirem o cavalinho da chuva – isto não é para vocês. É fascinante o tanto que se pode fazer com tão pouco! A cozinha conta apenas com o essencial: uma bancada, um pequeno fogão a gás e meia dúzia de utensílios… Só que o “chef” JCS vai cozinhando enquanto brinca e nos embala com o seu bom-humor e boa disposição. Ali dança-se, canta-se, “namora-se” com os alimentos, tudo com tempo, pausado e com carinho, enquanto se vai preparando o petisco, sempre ao som de excelente música e de algumas piadas com o câmera – Calú.

Mesmo quem não tem mãozinha de cozinheiro deve dar uma olhadela a esta delícia, sobretudo nos dias em que estamos “de chuva”, cabisbaixos, mal-humorados ou a precisar de genica. As cores de São Tomé e Príncipe e a alegria de JCS contagiam e curam!

3. Urbanar-te

A arte urbana, da rua com a rua e na rua, nas suas mais variadas formas é hoje em dia um potente dínamo cultural e uma das expressões de criatividade associadas a mensagens pensadas, com uma intenção clara (por vezes rompedora, provocadora ou agitadora), um espírito inovador e em constante transformação. Se andarmos com os sentidos alerta enquanto passeamos pelas ruas das grandes cidades do mundo, é impossível não sermos convidados pelos estímulos à nossa volta a apreciar obras de pintura, escultura, desenho, graffiti, entre outros.

Uma das características mais fascinantes de alguns destes artistas é a integração de materiais pouco convencionais nas suas criações, dando uma segunda oportunidade a estruturas e edifícios que estavam moribundos, à beira da morte, e esquecidos ou abandonados pela nossa vista. Mas muitas vezes não se ficam por aí, usando diretamente esses materiais já encaminhados ao desuso, ao lixo, ao fim terminal, como parte integrante e definidora das suas obras.

Nesta perspetiva transformadora e recuperadora, encontramos dois nomes que vêm realizando um trabalho simplesmente extraordinário, cada vez mais reconhecido em Portugal e a nível internacional.

Um verdadeiro mestre no uso da perspetiva, da escala e conhecido pelo perfeito realismo tridimensional, Odeith resgata paredes em escombros, espaços devolutos e outras estruturas abandonadas e dá-lhes uma nova vida. O seu trabalho surpreende pela forma, mas também pelo conteúdo e a visão conceptual que transpira em cada novo projeto do artista. Filho da revolução – nascido nos finais dos anos 70 – representa uma geração de ouro no que respeita à arte urbana em Portugal.

Um pouco mais jovem, nascido no final dos anos 80 e igualmente genial, Bordalo II tem uma abordagem artística simplesmente singular. Este artista recupera materiais do lixo e transforma-os em “luxo” artístico. Numa perspetiva que promove a reutilização dos materiais, protetora do ambiente, do planeta, da fauna e flora, o artista constrói enormes peças (normalmente em paredes de edifícios). As suas obras são indecifráveis ao perto, o que nos convida a distanciar-nos delas para podermos apreciar o que inicialmente parecera um monte de quinquilharia e sucata e agora se nos afigura como algo concreto e definido – quase sempre animais que se integram com a arquitetura. O nada, passa a ser algo através da interpretação de quem vê e sente.


Percam a vergonha e deem um salto pelo trabalho magnífico destes dois artistas lusitanos!

4. Grão a grão, em pedra dura… nem é 8, nem se mede aos palmos!

Zás! O carreto do trangalho dobrou-se, a roda do pivanço empenou e os provérbios mesclaram-se todos numa amálgama de desastre. Como saímos desta?

Sem stress, está aí o Babelite para salvar a situação! Esta web (de estética e aspeto pouco apelativos, há que dizê-lo) procura dar solução a uma das maiores dificuldades dos estudantes de línguas estrangeiras (e até de falantes nativos), enquanto faz também o papel fundamental de registo e arquivo.

As expressões idiomáticas e os provérbios são geralmente uma tremenda dor de cabeça! Representam lições, tradições, lendas, procuram fornecer uma moral ou derivam de factos históricos que frequentemente escapam aos falantes não nativos, sobretudo no início do percurso de progressão linguística. Ainda por cima, são usados com muita frequência e a impossibilidade (quase sempre) de os entender através da tradução literal e direta provoca angústia, chegando a impossibilitar a participação comunicativa eficaz.

Como funciona? Muito simples! Primeiro temos de escolher uma das 5 opções de línguas disponíveis (inglês, francês, castelhano, catalão ou português). Basta teclar a expressão ou a palavra-chave que pretendemos pesquisar e imediatamente são-nos sugeridas várias hipóteses como resultado. Podemos então consultá-las e procurar a que mais se adequa ao contexto em questão.

É fantástico? É apelativo? Não e não, mas procura esclarecer e dar respostas que nem sempre são fáceis, contribuindo para melhorar o conhecimento no domínio dos provérbios e das expressões idiomáticas. Não é excelente, mas é melhor que nada e, como se costuma dizer: quem não tem cão, caça com gato!

5. Curtas brasileiras

E vamos aproximando-nos do final da viagem de esta semana. É sempre bom ter a opção de escolher como acaba, como termina e se conclui o passeio e a aventura. Afinal de contas somos todos diferentes, sendo todos iguais. Aqui oferecemos a possibilidade de escolher como se ramifica o término, o interlúdio até à próxima semana.

Na web Novo Cine encontra-se disponível uma excelente seleção de curtas-metragens brasileiras, com elencos recheados de qualidade (estreias e valores inquestionáveis) e que abrangem um vasto leque de temas e géneros. Um autêntico manjar para os amantes da 7ª arte!

Todos os títulos em versão original e com legendas disponíveis em espanhol e inglês (para os que possam ter maior dificuldade de compreensão do português do Brasil).

Celebremos esta fantástica iniciativa da Embaixada do Brasil em Espanha. Divulgação através da qual ficamos a conhecer o que de melhor se está a fazer, no panorama do cinema mais atual, no outro lado do Atlântico.

Já fomos petiscando… impressionante o trabalho do “gigante” Lima Duarte em “A volta para casa”.

Vão lá buscar as pipocas!

O vosso espaço Queres falar connosco? Tens sugestões ou ideias? Há temas ou assuntos que gostarias de ver tratados? Queres colaborar com o LUSO QUÊ?? Estamos à tua espera de braços, ouvidos e olhos bem abertos! Escreve-nos